Nos últimos anos, o foco relacionado á faixa etária de incidência da endometriose vem mudando. No século passado mencionava-se que a idade de diagnóstico da moléstia era ao redor de 30 anos, entretanto, diversos trabalhos mostraram que o tempo entre o início dos sintomas e correto diagnóstico e tratamento é de aproximadamente 10 anos. Este fato faz com que, atualmente, a endometriose seja encarada como uma doença de adolescentes ou adultas jovens.
Segundo dados do American College of Obstetrics and Gynecology, 60% das mulheres com diagnóstico de endometriose referem sintomas antes dos 20 anos de idade. Em outros trabalhos, autores reportam que a doença é encontrada em 70% das laparoscopias realizadas em jovens com dismenorreia refratária ao tratamento medicamentoso.
Dentre os fatores de risco, destacam-se os antecedentes familiares. Jovens com parentes de primeiro grau acometidas tem 7 a 8 vezes mais chance de ter a doença do que as outras mulheres. Outros fatores como menarca precoce, aumento de fluxo menstrual e mal formações uterinas, principalmente as de caráter obstrutivo, também devem ser lembrados.
O diagnóstico pode ser feito baseado apenas no quadro clínico. Cólica menstrual progressiva, de forte intensidade, refratária ao tratamento medicamentosos habitual (analgésicos, anti-espasmódicos, anti-inflamatórios) que levam à diminuição de qualidade de vida (falta à escola ou trabalho, idas ao pronto atendimento para medicação endovenosa) faz o diagnóstico de endometriose. Queixa de dispareunia é relatada por 30% das mulheres. Da mesma forma que a dismenorreia, esta pode ser progressiva fazendo que a jovem tenha que interromper o coito em um primeiro momento e, após algum tempo, chega a evitar as relações sexuais, levando a consequências importantes na qualidade de vida. Em uma parcela das jovens, a queixa pode ser atípica, o que dificulta o diagnóstico. Dor pélvica crônica acíclica, por vezes, sem relação com o fluxo menstrual pode ser a única queixa em aproximadamente 30% das mulheres.
O exame ginecológico pode ser normal ou evidenciar discretas alterações, como dor à mobilização do colo ou ao toque de ligamento útero-sacro. Em casos avançados, nodulações em fórnice posterior de vagina e retroversão uterina fixa podem ser encontrados. A solicitação, nesta situação clínica, do marcador sérico CA 125 é desnecessária, e por vezes mais atrapalha do que ajuda. Em trabalho de revisão sistemática, Hirsch e cols mostraram que a sensibilidade do marcador é de cerca de 50%, portanto, apenas metade das portadoras vão apresentar elevação do CA 125.
Outra ferramenta utilizada são os exames de imagem. Estes são fundamentais na programação terapêutica e seguimento, entretanto tem pouco valor diagnóstico nas formas iniciais da moléstia. A solicitação indiscriminada de ressonância magnética ou ultrassonografia especializada leva a inúmeros diagnósticos falso positivos e negativos, podendo confundir o raciocínio clínico. Uma ultrassonografia endovaginal deve ser solicitada de rotina para afastarmos a presença de um endometrioma ovariano.
É fato, também que ainda existe a questão do diagnóstico da doença só poder ser feito por meio de uma videolaparoscopia com biópsia e subsequente confirmação anatomopatológica. Esta assertiva talvez seja um dos fatores que causam atraso diagnóstico, visto que a indicação de procedimento cirúrgico em jovens “só por causa de cólicas menstruais” é complicado, e, soma-se a isso o fato do tratamento inicial da doença ser clínico na maioria das situações. A laparoscopia é ferramenta reservada para quando houver falha de tratamento medicamentoso. Portanto, frente a quadro clínico típico está indicado o início do tratamento.
O tratamento tem dois objetivos principais: melhorar a queixa álgica, restabelecendo assim melhora na qualidade de vida e inibir a progressão da doença, preservando assim, a fertilidade. A medicação de primeira linha para este fim são os contraceptivos hormonais. Devem ser utilizados de forma contínua. A indicação de formulação, estroprogestativa ou apenas com progestagênios, segue critérios não relacionados à doença, visto que nenhum estudo mostrou superioridade de um composto sobre outro. Da mesma forma os progestagênios podem ser utilizados e são igualmente efetivos no tratamento da dor.
Caso não haja melhora dos sintomas após 3-6 meses de tratamento medicações ditas de segunda linha podem ser utilizadas. Os análogos do GnRH são uma opção, mas devem ser utilizados, sempre, junto com a terapia de adição hormonal. E medidas para evitar a diminuição de massa óssea, como incentivo a atividade física e aumento da ingestão de cálcio, devem ser estimuladas. Outras medicações também estão disponíveis, porém com poucas evidências científicas relacionadas à eficácia, dentre estas podemos elencar a gestrinona via vaginal. O danazol e a gestrinona via oral tiveram seu uso descontinuado devido aos efeitos colaterais.
Caso, mesmo após o uso de medicação de primeira e segunda linha, não haja melhora do quadro clínico, a cirurgia deve ser indicada. A insistência, com o uso de inúmeras medicações, no tratamento medicamentoso não é uma boa prática, visto que a jovem vai conviver com uma baixa qualidade de vida por muito tempo.
Importante salientar que, de acordo com estudo publicado por Chapron e cols, pode haver progressão da enfermidade em uma parcela de mulheres que responderam ao tratamento clínico. Ou seja, mesmo aquelas que tiveram melhora acentuada das queixas álgicas devem ser monitorizadas no que se refere à evolução da endometriose. Para tanto, os exames de imagem são fundamentais. Uma ultrassonografia especializada ou ressonância magnética basal deve ser solicitada e repetida anualmente, principalmente nos primeiros três anos após o início do tratamento. Após este período, caso não haja progressão, podemos realizar o seguimento clínico.
Frente a endometrioma de ovário, a conduta pode ser medicamentosa para aqueles menores do que 3 cm, mas há controvérsia em relação ao tamanho do cisto para indicação de cirurgia, visando a preservação da fertilidade.
Em algum momento, caso haja progressão da moléstia o tratamento deve ser reavaliado. Nesta situação, frequentemente a cirurgia é indicada. Indicando a laparoscopia, esta deve ser precedida de exame de imagem especializado (ultrassonografia especializada ou ressonância magnética) visando o correto planejamento da mesma. A cirurgia deve, obrigatoriamente, visar a eliminação de todos os implantes da doença, além de restabelecer a anatomia pélvica.
Em casos de doença avançada, o uso no pós-operatório de análogos do GnRH por seis meses parece diminuir a chance de recidiva. Após este período, visto ser a endometriose doença menstruação-dependente, utilizamos contraceptivos (orais, transdérmicos, implantes cutâneos ou sistema intra-uterino) por tempo indeterminado, até que haja desejo de gestação.
Fonte de pesquisa : febrasgo.org.br